quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Navegando contra o vento

Navegar contra o vento, ainda que com lenço e documento, é sempre mais difícil, vai-se lento, é cansativo varar as ondas de frente, ziguezagueia-se a bombordo e estibordo, camba-se para lá e para cá, vai-se mais para os lados que para frente e nunca se vencem grandes distâncias sem grande esforço. Foi assim que nunca aprendi a velejar.
Da mesma forma navegaram as ideias oposicionistas, subversivas, segundo alguns, ao longo da história. E não importa a cor do barco, ou das velas. Quando soprava o vento do liberalismo, ou capitalismo selvagem, para alguns, remavam de través os da esquerda. "Comunista!", gritavam para mim, ao volante do meu Passat repleto de adesivos de Lulalá. Estávamos em 1989. "Subversivo!", era meu adjetivo. Minhas velas eram vermelhas, com foice e martelo amarelos. Eu sonhava com um Brasil igualitário. Proletários no poder, eu pensava, seria a solução para todas as doenças tupiniquins. Não era de malária que eu falava, era de patrimonialismo, nepotismo, coronelismo, injustiça, desigualdade social. 
E o vento mudou, após tempestades incríveis, alucinantes. E após uma década, esse novo vento, contrário ao anterior, sopra forte. As velas da esquerda içadas, imponentes, firmes, infladas como balões. Mas minha viagem não se tornou mais fácil, pois as velas do meu barco não são mais vermelhas, e nem tampouco azuis e amarelas, são cinzas. Cinzas de dúvida. Talvez levado pelo desafio de sempre remar contra o vento, desafio as novas ondas, agora ao contrário, e novamente de frente. "Liberal!", gritam, "Reacionário!", me acusam, "Retrógrado!", me julgam. Outra vez sou minoria, sou oposição. E a oposição é sempre "errada", é sempre "do contra", é sempre "nociva". Ou seria, melhor dizendo, a situação sempre "certa", e sempre intolerante com os contrários, com os rebeldes, como os liberais capitalistas no poder eram com os comunistas trabalhistas do século XX, e como os assistencialistas trabalhistas são com os liberais capitalistas do século XXI.
Não sou radical como meu xará de sobrenome Bastiat, autor de La Loi, de 1850, publicado dois anos após o Manifest der Kommunistischen Partei, de Marx e outro xará meu, por coincidência, de sobrenome Engels. Bastiat, aquele sim era louco, lunático, viajandão, utópico da extrema direita, defensor do estado menos que mínimo, mas não menos lunático que o ideal de igualdade pregado pelo comunismo, baseado na utopia Rousseauniana da bondade natural. Sou apenas de centro-direita, defendo um Estado forte, porém sensato, que não dê o peixe, mas ensine a pescar, e não deixe de regular os abusos do poder econômico, e promova a reforma agrária (aquela que, incrivelmente, nossa esquerda esqueceu assim que subiu ao poder, como também não se lembra de diminuir uma das maiores cargas horárias trabalhistas semanais do mundo, apesar de se dizer "trabalhista").
Sem puxar a sardinha nem para a brasa da direita e nem da sinistra, digo, da esquerda, pois como já falei, minha bandeira hoje é cinza, o que me intriga é a enorme semelhança entre todas as bandeiras que tremulam sobre o solo brasileiro. Falar do fim das ideologias, da coligação entre siglas sem sentido, que mudam, as siglas e as coligações, a cada eleição, e são diferentes dependendo de outra sigla, a do estado da federação, é chover no molhado. Falo, então, apenas de uma semelhança específica, nociva, destruidora, cruel e antidemocrática: a intolerância.
O ser humano, seja de que banda ele venha, não é igual. Fulano é A, Sicrano é B, Beltrano é C. O ser humano também não é bom, não é solidário (talvez seja no Japão... talvez lá haja uma outra espécie humana, capaz de recolher dinheiro dos outros entre escombros de um terremoto e devolvê-lo ao dono), e, sobretudo, não respeita a opinião alheia. Parece que pertencer a uma maioria, fazer parte da "unanimidade", do "senso comum", tem por efeito colateral tornar-se intolerante. Assim são os heterossexuais em relação aos homo, são os religiosos em relação aos ateus, são os assistencialistas em relação aos liberais capitalistas,  bem como eram os capitalistas em relação aos comunistas.
A democracia não se garante apenas através do sufrágio universal. Este apenas garante que o Estado seja administrado pelo escolhido da maioria. O processo democrático vai muito além, alcança e abrange a liberdade de expressão e, acima de tudo, o respeito à expressão e à opinião alheia, ainda que minoritária.
Assim, quem quer que leia esse humilde desabafo que exteriorizo aqui, faça-me o favor de, em discordando, respeitá-lo. Sou ateu, sou capitalista, acredito na livre iniciativa, não torço pela Seleção Brasileira de Futebol, não curto carnaval, axé e nem música sertaneja, e sou contra o assistencialismo, entre outras coisas. E, acima de tudo, respeito opiniões diferentes das minhas!
Quem estiver navegando de vento em popa, meu parabéns! Navego eu de través, às cambadas, mas navego para onde quero ir, não para onde o vento pretende de me levar.